Durkheim, As regras do método sociológico e o positivismo.



O século XIX é um período de grande ebulição política e intensas transformações sociais. As conquistas da revolução francesa traziam um novo apanágio à vida urbana europeia. As promessas de liberdade, igualdade e fraternidade encampadas no século XVIII ainda ecoavam no coração e na perspectiva histórica do trabalhador; contrastando com a esperança de um mundo melhor e igualitário e com uma memória e imagem idílica do passado campesino/parnasiano; o presente era algo desolador. As transformações operadas pelo capitalismo nas paisagens e na vida das pessoas apontavam no sentido da desumanização do homem. A natureza cedia lugar a um mundo feito de aço e concreto, de nuvens que se tornavam cada vez mais escuras, o ar deixava de ser puro e fresco e passava a ser fétido e impuro, o ritmo e o objetivo do trabalho começavam a ser ditados segundo a lógica da máquina e a pressa do mercado. A novas condições e relações de trabalho acentuavam de forma progressiva o antagonismo de classes, as revoltas e revoluções eclodiam em toda Europa. Tantas transformações no mundo do trabalho e da política criaram a necessidade e a urgência de uma nova ciência social que dessem conta de entender essas mudanças. O desafio dessa ciência nova seria encontrar um método que se contrapusesse aos idealismos e especulações da filosofia e as visões deterministas e místicas da religião. As primeiras tentativas partiam das premissas das ciências naturais como a química e a física, onde os objetos podem ser conhecidos pelos sujeitos de forma aparentemente neutra, tendo em vista que uma pedra ou um elemento químico podem ser testados em laboratórios, comparados e analisados sem que interfiram sobre o pesquisador. Para Auguste Comte o conhecimento positivo era uma etapa superior e verdadeiramente científica do conhecimento, superando o estado teológico (religião) e metafísico (filosofia), ambas formas de manifestações da racionalidade humana contaminadas pela imaginação e pela nossa própria subjetividade.
É com base nos princípios da cientificidade, objetividade e da laicidade que surge a sociologia positivista Comte e que ganharia um método consagrado com o francês Émile Durkheim. Os primeiros sociólogos positivistas como Condorcet e Comte tentavam aplicar à chamada ciência positiva os métodos e premissas das ciências da natureza. Esses esboços sociológicos dos primeiros positivistas, entretanto, careciam de melhor sistematização, conceptualização e de uma delimitação melhor do seu objeto de estudo. Com a preocupação de dar a sociologia um status de ciência e não com uma mera interpretação das sociedades tendo outras ciências como base epistemológica; Durkheim escreve em 1895 “As regras do método sociológico”.
O método durkheimiano delimita o objeto da sociologia e demonstra como esse se revela ao pesquisador. Para Durkheim o sociólogo deve entender os “fatos sociais”, em vez de estudar o sujeito, cabe ao pesquisador entender as “coisas”, forças sociais de caráter coercitivo que operam na sociedade de modo a forçar os sujeitos a agirem não como indivíduos, mas como parte de um grupo de pessoas que comungam de práticas culturais e valores morais comuns ou/e, mesmo em sociedades onde exista um multiculturalismo o princípio da coerção social se dá pela predominâncias de uma cultura dominante e um modus operante que marginaliza e oprime outras práticas.
Para descobrir os “fatos sociais”, ou seja, as forças coercitivas que orientam a ação dos sujeitos, o sociólogo deve procurar se distanciar ao máximo do seu objeto. A tradição científica construída pelos modernos como Copérnico e Galileu traziam a importância da objetividade e da evidencia, sobretudo a partir da matemática e da análise concreta dos objetos. Nas ciências humanas os positivistas tentavam então anular o componente humano, a nossa subjetividade, por isso Durkheim diz que fatos sociais são coisas. A sua obra o Suicídio tenta analisar esse fenômeno a partir de dados, números e fatos sociais, desconsiderando a particularidade e a história dos indivíduos que se matam, considerando apenas fatores exteriores e coercitivos.


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