Os sofistas e Sócrates
O período pré-socrático foi dominado,
em grande parte, pela investigação da natureza. Essa investigação tinha um
sentido cosmológico. Era a busca de explicações racionais para o universo
manifestada na procura de um princípio primordial (arché) para todas as coisas
existentes. Seguiu-se a esse período uma nova fase filosófica, caracterizada
pelo interesse no próprio homem e nas relações do homem com a sociedade. Essa
nova fase foi marcada, no início, pelos sofistas.
Etimologicamente, o termo sofista significa sábio.
Entretanto, com o decorrer do tempo, ganhou o sentido de impostor, devido,
sobretudo, às críticas de Platão.
Os sofistas eram professores viajantes que, por
determinado preço, vendiam ensinamentos práticos de filosofia. Levando em
consideração os interesses dos alunos, davam aulas de eloqüência e sagacidade
mental. Ensinavam conhecimentos úteis para o sucesso dos negócios públicos e
privados.
O momento histórico vivido pela civilização grega
favoreceu o desenvolvimento desse tipo de atividade praticada pelos
sofistas. Era uma época de lutas políticas e intenso conflito de opiniões nas
assembléias democráticas. Por isso, os cidadãos mais ambiciosos sentiam a
necessidade de aprender a arte de argumentar em público para, manipulando as
assembléias, fazerem prevalecer seus interesses individuais e de classe.
As lições sofísticas tinham como objetivo o
desenvolvimento do poder de argumentação, da habilidade retórica, do
conhecimento de doutrinas divergentes. Eles transmitiam todo um jogo de
palavras, raciocínios e concepções que seria utilizado na arte de convencer as pessoas,
driblando as teses dos adversários.
Segundo essas concepções, não haveria uma verdade
única, absoluta. Tudo seria relativo ao homem, ao momento, a um conjunto de
fatores e circunstâncias.
Nascido em Atenas, Sócrates (469-399
a.C.) é tradicionalmente considerado um marco divisório
da história da filosofia grega. Por isso, os filósofos que o antecederam são
chamados pré-socráticos e os que o sucederam, de pós-socráticos. O próprio
Sócrates não deixou nada escrito, e o que se sabe dele e de seu pensamento vem
dos textos de seus discípulos e de seus adversários.
O estilo de vida de Sócrates assemelhava-se ao dos
sofistas, embora não vendesse seus ensinamentos. Desenvolvia o saber filosófico
em praças públicas, conversando com os jovens, sempre dando demonstrações de
que era preciso unir a vida concreta ao pensamento. Unir o saber ao fazer, a
consciência intelectual à consciência prática ou moral.
O autoconhecimento era um dos pontos fundamentais da
filosofia socrática. “Conhece-te a ti mesmo”, frase inscrita no templo de
Apolo, era a recomendação básica feita por Sócrates a seus discípulos.
Sócrates percebe que a sabedoria começa pelo
reconhecimento da própria ignorância. “Só sei que nada sei” é, para Sócrates, o
princípio da sabedoria, atitude em que se assume a tarefa verdadeiramente
filosófica de superar o enganoso saber baseado em idéias pré-concebidas. Sua
filosofia era desenvolvida mediante diálogos críticos com seus interlocutores.
Esses diálogos podem ser divididos em dois momentos básicos: a ironia (do grego
eironeia, perguntar fingindo ignorar) e a maiêutica (de maieutiké, relativo ao
parto). Na linguagem cotidiana, a ironia tem um significado depreciativo,
sarcástico ou de zombaria. Mas não é esse o sentido de ironia socrática. No
grego, ironia quer dizer interrogação. Sócrates interrogava seus interlocutores
sobre aquilo que pensavam saber. O que é o bem? O que é a justiça? São exemplos
de algumas perguntas feitas por ele.
Com habilidade de raciocínio, procurava evidenciar as
contradições afirmadas, os novos problemas que surgiam a cada resposta. Seu
objetivo inicial era demolir, nos discípulos, o orgulho, a ignorância e a
presunção do saber. A ironia socrática tinha um caráter purificador na medida
em que levava os discípulos a confessarem suas próprias contradições e
ignorâncias, onde antes só julgavam possuir certezas e clarividências. Libertos
do orgulho e da pretensão de que tudo sabiam, os discípulos podiam iniciar o
caminho da reconstrução das próprias idéias. Nesta segunda fase do diálogo, o
objetivo de Sócrates era ajudar seus discípulos a conceberem suas
próprias idéias. Essa fase do diálogo socrático, destinada à concepção de
idéias, era chamada de maiêutica, termo grego que significa arte de trazer à
luz.
A doutrina socrática identifica o sábio e o homem
virtuoso. Derivam daí diversas conseqüências para a educação, como: o
conhecimento tem por fim tornar possível a vida moral, o processo para adquirir
o saber é o diálogo, nenhum conhecimento pode ser dogmaticamente, mas como
condição para desenvolver a capacidade de pensar, toda a educação é
essencialmente ativa, e por ser auto-educação leva ao conhecimento de si mesmo,
a análise radical do conteúdo das discussões, retirado do cotidiano, leva ao
questionamento do modo de vida de cada um e, em última instância, da própria
cidade. Interessado somente na prática da virtude e na busca da verdade,
contrariava os valores dogmáticos da sociedade ateniense. Por isso, recebeu a
acusação de ser injusto com os deuses da cidade e de corromper a juventude. No
final do processo foi condenado a beber cicuta (veneno). A história de sua
acusação, defesa e execução é contada nos belos diálogos de Platão, Apologia de
Sócrates e Fédon.
Diferenças ente Sócrates e os sofistas:
1-
o sofista é um professor ambulante. Sócrates é alguém ligado aos destinos de
sua cidade.
2-
O sofista cobra para ensinar. Sócrates vive sua vida e essa confunde-se com a
vida filosófica: “ Filosofar não é profissão, é atividade do homem livre”
3-
O sofista “sabe tudo”, e transmite um saber pronto, sem crítica ( que Platão
identifica com uma mercadoria, que o sofista exibe e vende). Sócrates diz nada
saber e, colocando-se no nível de seu interlocutor, dirige uma aventura
dialética em busca da verdade, que está no interior de cada um
4-
O sofista faz retórica. Sócrates faz dialética. Na retórica o ouvinte é levado
por uma enxurrada de palavras que, se adequadamente compostas, persuadem sem
transmitir conhecimento algum. Na dialética, que opera por perguntas e
respostas, a pesquisa procede passo a passo, e não é possível ir adiante sem
deixar esclarecido o que ficou para trás.
O sofista refuta por refutar, para ganhar a disputa verbal. Sócrates refuta
para purificar a alma de sua ignorância.
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